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Cântico dos cânticos de Salomão: introdução e comentário

Last updated on 24/07/2021

O Livro Cântico dos Cânticos é de autoria do rei Salomão. No 1º Livro dos Reis de Israel (4:32) temos uma referência a isso. Além disso, o próprio Livro dos Cânticos faz várias referências a Salomão pelo nome (1:1; 3:7,9,11; 8:11,12). Por sua autoria ser atribuída ao rei Salomão, sua redação se situa dentro do século 10 AEC. Este breve comentário bíblico nos dará uma introdução resumida, mas precisa a essa poesia de amor.

O título do livro sugere que ele é uma coleção especial dos melhores cânticos que o rei compôs, por isso “Cântico dos Cânticos”.

Seu objetivo é abordar de forma poética e romântica o amor conjugal (1:4,16; 6:4-7; 7:12). Algumas figuras de comparação parecem muito estranhas a nós, pois são abordadas do ponto de vista oriental antigo, que é bem distante do nosso atual cotidiano (cf. 1:9; 2:9; 4:2; 6:4; 7:3). Além disso, os Cânticos retratam muito bem na forma escrita a criação do corpo e a atração que o marido sente para com sua esposa, e vice-versa (1:10,15; 2:2-6,10-14; 4:1,3,7,9,10; 5:4,8). O desejo e atração sexual de um para com o outro está em alta no decorrer do livro (1:2,13; 4:5,11,16; 5:13-15; 7:2-3,7-8; 8:10).

Cântico dos cânticos aborda este amor e a chama da paixão conjugal como algo bom, formoso e procedente do próprio Deus, digno de ser celebrado, bem como se sugere em Provérbios 5:18-19 (cf. Heb. 13:4).

Quem era a mulher de Salomão, a “sulamita”, no Cântico dos Cânticos?

Primeiro de tudo, vale ressaltar que “sulamita“, que aparece em Cântico dos Cânticos 6:13, não é um nome próprio, e portanto não era o nome da mulher que participa do cântico dos cânticos com o rei Salomão.

O Dicionário Bíblico Strong classifica “sulamita” (שולמית) como um adjetivo da língua hebraica que significa “a perfeita” ou “a pacífica“. Este adjetivo, assim como o nome do próprio rei Salomão, que no original hebraico é “Shelomó“, tem raiz na palavra שלם (shalam), que significa “estar em uma aliança de paz, estar em paz, pacífico, fazer as pazes, viver em paz”, dentre outros. Daí também vem a bendita e tão conhecida palavra “shalom” (שלום).

Sulamita poderia ser um apelido que a mulher do livro dos cânticos de Salomão recebera, como se o rei fosse o pacificador e ela a pacificada, aquela que nele encontrou a paz (Ct 8:10), como registrado na introdução a este livro na Bíblia de Jerusalém.

O adjetivo “sulamita” se aproxima ainda de outro adjetivo também encontrado na Bíblia, que é “sunamita“. Este último se refere a uma jovem chamada Abisag, que foi uma espécie de enfermeira e quase concubina para o rei Davi em sua velhice (1º Rs 1:1-4). Sunamita é um adjetivo pátrio para uma pessoa que é da cidade de Suném, mencionada na Bíblia em Josué 19:18; 1º Samuel 28:4 e 2º Reis 4:8.

É possível que Abisag tenha sido a mulher do Cântico dos Cânticos, já que Salomão a conheceu e ela era muito bela? Não sabemos. Mas isso nos deixa muito inclinados a acreditar que essa jovem possa ter sido o primeiro amor do rei Salomão, embora nada disso seja mencionado na Bíblia. O que sabemos é que Salomão, depois de ter subido ao trono real, tem uma briga com seu irmão mais velho por causa dela (1º Rs 2:17-25), mas isso provavelmente se dá porque Adonias almejava alguma posição melhor dentro da família real e queria ainda ser o rei (cf. v. 15; 1º Rs 1:5-55).

Qual é a mensagem teológica por trás do livro dos cânticos de Salomão?

Do ponto de vista teológico, a única vez em que se faz menção a Deus é no capítulo 8 versículo 6 através da palavra שַׁלְהֶבֶתְיָה (shalhevet Yah), que é uma junção das palavras שלהבת (shalhevet) e יָה (Yah), que se refere ao nome Dele. Muitas traduções bíblicas, porém, não colocam aqui o Nome, mas simplesmente traduzem “chamas intensas” ou algo parecido (ex.: ARA, NAA, NVT, ACF). No entanto, ao examinar o texto hebraico, o Nome aparece ali.

“Coloca-me,
como sinete sobre teu coração,
como sinete em teu braço.
Pois o amor é forte, é como a morte,
e o ciúme é inflexível como o Xeol.
Suas chamas são chamas de fogo
uma faísca de Iahweh.
As águas da torrente jamais poderão apagar o amor,
nem os rios afogá-lo.
Quisesse alguém dar tudo o que tem para comprar o amor…
Seria tratado com desprezo.”
(Cântico dos Cânticos 8:6,7 Bíblia de Jerusalém)

Neste caso as “chamas de Yah” são comparadas à força do amor.

As chamas de Deus aqui são provavelmente uma alusão a episódios em que o Seu fogo mostrou sua força, consumindo o que estivesse em seu caminho (vide Jó 1:16 e Núm 11:1-3; Êx 24:17; Dt 9:3; cf. época posterior a Salomão em 1º Rs 18:38 e 2º Rs 1:12). Comparado a essa força é o amor do casal, que não seria jamais destruído por qualquer adversidade. Podemos concluir isso ao fazer o paralelo com o início do versículo 7.

Ainda tratando-se do ponto de vista teológico do Livro dos Cânticos, o que passa da aplicação direta abordada nos versículos 6-7 fica muito no campo das especulações, já que o texto não foi escrito diretamente com finalidade de explicar teologia. No entanto, cerca de 10 séculos após os escritos de Salomão, já que Paulo compara o casamento de marido e mulher com a união do Senhor e seu povo em Efésios 5:23-32, muitos teólogos fazem assimilação do conteúdo dos Cânticos com este amor de Deus por seu povo também.

Tal sentido teológico do texto não é mau intencionado, mas só pode ser extraído de modo especulativo, e por isso é subjetivo também. Isto é, o leitor pode ver ali uma referência ao amor de Deus por seu povo ou não. Todavia, visto que o livro destaca muitos aspectos sensuais do relacionamento entre homem e mulher, pode-se considerar o conteúdo do livro unicamente de aspecto humano.

De forma similar ao relacionamento descrito nos Cânticos, por exemplo, Salomão também aconselha o marido a conservar amor e atração sexual por sua própria esposa em Provérbios 5:18-19, e deste texto geralmente nenhum conteúdo teológico é extraído. Portanto, o Livro dos Cânticos tem como finalidade unicamente demonstrar a beleza e a força do amor e atração conjugal de marido e mulher, como vimos em todas as referências bíblicas citadas aqui.


Outras leituras recomendadas acerca do casamento e romance.

Casamento blindado 2.0, por Renato Cardoso e Cristiane.

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