Last updated on 14/07/2021
O que podemos dizer de pessoas (supostamente) recém convertidas ao evangelho que tem o hábito de ler trechos isolados da Bíblia e fazerem interpretações pessoais, adotando sua própria dedução como sendo a verdade? Haveria realmente algum tipo de perigo nesta prática? Será que a Bíblia pode ser entendida de modos diferentes por cada pessoa? Seria esse o modo correto de estudá-la? Será que até mesmo lideranças estão errando em seu ensino devido a práticas como essas? Ao abordar a introdução bíblica veremos se este, dentre muitos outros costumes, são realmente bons ou não.
Esse texto faz parte de uma redação que eu escrevi para o seminário teológico acerca da importância da disciplina “introdução bíblica”.
Uma reflexão acerca do movimento evangélico no mundo.
Desde meados do século 20, o movimento evangélico no Brasil tem se expandido de tal forma, que o número de evangélicos no país já alcançou seus milhões. Isso é muito bom, pois mais pessoas estão crendo em Deus, mais pessoas abraçando a fé e se tornando seguidores do Senhor Jesus. Hoje, geralmente, não se anda por uma avenida no país sem se ouvir em algum comércio um hino evangélico, por exemplo.
Entretanto, com tal crescimento acelerado da população cristã, infelizmente surgem também outros problemas. Várias diferenças doutrinárias que às vezes causam divisão de uma “denominação” de igreja para com a outra, e cada uma reivindica estar pregando a verdade.
Além disso, surgem também diversos tipos de teologia, cada uma crendo em um ensinamento diferente. Além do mais, o que mais tem causado impacto e refletido em como os evangélicos são vistos na sociedade, são os movimentos pentecostais nas reuniões deles, movimento este também conhecido como reteté.
Devido aos diferentes costumes, diferentes ensinamentos, teologias que se desencontram umas das outras e “brigam” entre si, não poucas pessoas vivem a se perguntar: “Quem está certo afinal de contas?”
Enquanto isso, outras pessoas que até tem vontade de abraçar a fé em Deus, acabam não se aproximando devido a certos costumes que para elas parecem esquisitos. “Será que Deus está no meio disso tudo?” “Será que quando eu me converter terei que agir assim?” Essas são algumas das perguntas que se fazem os não crentes ainda, ou os novos convertidos.
Além disso, discriminações diferentes passam a fazer parte do convívio comum evangélico: “se não fala em línguas não é batizado com o Espírito Santo”, “se não subiu ao monte para orar nunca experimentou o sobrenatural de Deus de verdade”, “se falar ‘shalom’ ou ‘Yeshua’ está trazendo o judaísmo para dentro da igreja”, “membros de diferentes denominações não podem tomar a ‘santa ceia’ juntos”, “qual é a forma correta de se batizar”, e por aí vai.
Desta forma, o mundo vai vendo uma igreja desunida e confusa, crentes que professam a mesma fé, porém tem dificuldades de se entender. E assim a chamada “igreja do Senhor”, “noiva do Cordeiro”, “corpo do Cristo”, jamais pode cumprir a palavra de seu próprio Senhor, que disse:
Para que todos sejam um; como tu, meu Pai, estás em mim e eu em ti, que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes dei a glória que tu me deste, para que sejam um, tal como nós somos um. Eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos em unidade, para que o mundo saiba que tu me enviaste, e que os tens amado, como também tens amado a mim. (João 17:21-23 Bíblia Peshitta BV Books)
Será que o mundo, isto é, as pessoas não crentes, têm olhado para os crentes e visto nossa unidade? Será que, vendo essa unidade, reconhecem por meio de nós que Jesus, isto é, Yeshua, o Salvador, veio ao mundo, que é real? Que essa questão, por agora, seja de reflexão pessoal.
No entanto, no cerne dessa situação existe um problema em comum, problema este que gera todo tipo de outros problemas. Não é um novo problema, porque no 1º século de nossa era o mesmo já existia e já fora relatado. Vejamos:
Considerareis, pois, que a paciência do Senhor é para salvação, como também nosso amado irmão Paulo vos escreveu, de acordo com a sabedoria que foi concedida a ele, como também em todas as suas epístolas ele fala nelas destas coisas, entre as quais há algumas coisas difíceis de compreender, que os indoutos e instáveis torcem, como também o fazem com o restante das Escrituras, para sua própria perdição. (2ª Pe. 3:15,16 Bíblia Peshitta BV Books)
Para iniciar nossa análise deste trecho, e informar o que ele tem em comum com as problemáticas relatadas acima, as demais que giram em torno do meio evangélico e o que tem a ver com a disciplina introdução bíblica, vejamos o significado das palavras “indouto” e “torcer”.
Indouto: que ou aquele que não é douto, que não tem erudição. que ou aquele que não é instruído; ignorante.
Torcer: [Figurado] Dar, intencionalmente, interpretação diversa ao que se diz, desvirtuar (o sentido de palavras ou frases). Ex.: torceu minhas palavras; torceu para a mentira que lhe interessava.
Virar, mudar de direção, de orientação: torcer um propósito em outro.
Simão explica que aqueles que não são corretamente instruídos no estudo das Escrituras Sagradas acabam “torcendo”, isto é, deturpando, dando um sentido falso, uma interpretação distorcida ao que as Escrituras realmente dizem.
Justamente por isso os crentes são cheios de manias estranhas, alegam que certas histerias emocionais são experiências espirituais, não se conduzem corretamente ou adequadamente de acordo com a sã doutrina, dão mais lugar ao fanatismo espiritual e às supostas experiências sobrenaturais do que ao raciocínio das coisas, para que se conduzam de maneira sábia, inteligente, justa, santa e honesta em meio a este mundo que jaz no maligno (cf. 2 Pe 3:11).
Olhando por este lado, percebemos a importância de uma boa introdução bíblica para trazer o crente à iniciação no entendimento correto das Escrituras Sagradas.
Os diversos assuntos abordados nessa disciplina fazem o crente entender de forma panorâmica e amadurecida o que são as Escrituras Sagradas e o que elas representam para a vida dele. Além de como ele deve conduzir sua própria vida de acordo com a palavra de Deus.
O estudo da introdução bíblica revela o temor que devemos a Deus, pela revelação de sua palavra, por sua fidelidade, seu poder e autoridade sobre a vida do homem.
Jesus disse:
“Vós errais, não compreendendo as Escrituras, nem o poder de Deus.” (Mateus 22:29 Bíblia Peshitta BV Books)
Com isso, o Senhor afirma o quão importante é estudarmos corretamente as Escrituras, fazendo uso de seu idioma original e analisando seu contexto também.
No entanto, ler por ler todos lemos. Não são poucos os crentes que sabem de cor o Salmo 91, por exemplo, também o 23, 37, etc. Não obstante, será que são muitos os que se conduzem em conformidade com as Escrituras Sagradas?
Felizes os íntegros em seu caminho, os que andam conforme a lei de Iahweh. Felizes os que guardam seus testemunhos, procurando-o de todo o coração, e que, sem praticar iniquidade, andam em seus caminhos! (Salmo 119:1-3 Bíblia de Jerusalém)
O Salmo 119 mostra exatamente o que é se conduzir no ensino de Deus, a Torá (adicionalmente os profetas, apóstolos e a mensagem do Senhor).
Como se conduzir, porém, em uma Lei que não se conhece suas origens? Que não se sabe para quem foi escrita e por qual motivo? Que se desconhece o significado original de suas palavras e o contexto histórico que envolvia cada situação?
Conhecer que a Bíblia Sagrada é a palavra de Deus revelada ao homem, investigar à fundo seu idioma original com uma boa introdução bíblica, é o ponta pé inicial básico para entender as Escrituras corretamente.
Ademais, como lidar com as muitas diferenças entre os versículos bíblicos, que são as variações textuais, que temos hoje em cada uma das versões de nossas Bíblias? Posso citar o exemplo de 1 João 5.7:
Porque três são os que testificam no céu: o Pai, a Palavra, e o Espírito Santo; e estes três são um. (ACF)
Há três que dão testemunho: (NVI)
Como explicar tais diferenças “gritantes” no texto de uma bíblia para outra? É claro que uma investigação se faz necessária.
A introdução bíblica nos leva a viajar na história e conhecer as nuances da transmissão do texto bíblico, de sua redação, sua inspiração e sua autoridade.
Inclusive, a Bíblia de Jerusalém é uma boa indicação quando se trata dessa matéria.
Sem uma boa introdução bíblica muitas coisas ficariam obscuras, variantes textuais sem explicação, origem da Bíblia incerta, e com tudo isso nossa crença seria meramente subjetiva, e portanto duvidosa, não verdadeira, opcional.
Eu poderia dizer que mesmo que eu decorasse todos os versículos da Bíblia, mas não fizesse um estudo de introdução à Bíblia Sagrada, meu entendimento ficaria com um lado obscuro no final das contas, uma interrogação a qual eu não saberia responder, e com isso poderia interpretar errado várias passagens bíblicas.
É grande a importância da história e de grande valor saber as condições em que o texto bíblico foi escrito, quem eram as pessoas que o escreveram e por que o escreveram. Essas pessoas falavam meramente por si? Queriam elas apenas dar lição de moral nas pessoas más de seu tempo? Estavam impondo uma religião ou verdadeiramente falando palavras que o Criador as deu? Como perceber isso, diferenciando uma coisa da outra?
A introdução bíblica nos ajuda a conhecer a autoridade Divina por trás do texto, a justiça divina, e portanto a forma como cada um de nós deve lidar com as Santas Escrituras.
É possível que alguém ainda hoje escreva um livro e diga que suas palavras foram diretamente reveladas por Deus? Se essa pessoa reivindicar que seus escritos são tão sagrados quanto a Bíblia, ainda que de fato tenham algum valor religioso, eu poderia basear sermões e mensagens neles?
A introdução bíblica nos explica que a única autoridade sobre a nossa vida é a palavra de Deus. Ela mostra-nos porque só aqueles 66 livros são aceitos como canônicos, isto é, como divinamente inspirados e reconhecidos como Escrituras Sagradas. E por isso, tendo os livros da Bíblia autoridade Divina, são a “vara de medir” para todos os outros escritos, isto é, são o modelo que todos os outros devem seguir, a fonte de onde todos os outros devem “beber”.
Para concluir, os que rejeitam a instrução e não investigam em busca de conhecimento, tornam-se indoutos. E estes, como já vimos, distorcem as Escrituras Sagradas e acabam trazendo para o convívio dos crentes diversas deturpações doutrinárias e teológicas. Além disso, carregam em sua bagagem vários maus costumes e os expõem aos outros como se viessem de Deus.
Compre a verdade e não a venda; compre a sabedoria, a instrução e o entendimento. (Provérbios 23:23)
A introdução bíblica é a porta de entrada para entender que as Escrituras Sagradas devem ser nosso professor, porque nelas temos os ensinamentos e ordenanças de nosso Senhor e Salvador.
Em suma, a introdução bíblica é reconhecimento da inspiração da Bíblia, e consequente autoridade Divina sobre a vida dos homens, de acordo com esta Palavra.
Este estudo teve como finalidade te motivar a estudar mais a Bíblia.
Para se aprofundar mais, é interessante se dedicar também, lendo outras obras que abordam mais à fundo este assunto. Algumas dessas foram indicadas no decorrer do estudo, aqui abaixo segue uma lista delas e de outras.
- E Deus Falou Na Língua Dos Homens: uma introdução à Bíblia, Capa comum, por Paulo Won.
- Introdução Bíblica, Capa comum, por Norman Geisler (Autor), Oswaldo Ramos (Tradutor);
- Introdução à interpretação bíblica, Capa dura, por Hubbard Junior. Robert L. (Autor), Craig L. Blomberg (Autor), William W. Klein (Autor), & 1 mais;
- Introdução ao Hebraico Bíblico, Capa comum, por Mark D. Futato;
- Bíblia Peshitta, Editora BV Books;
- Bíblia de Jerusalém, Paulus Editora.
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2 Comments
Matéria muito bem articulada! Porém, custo a crer que a compreensão do texto Bíblico seja apenas para os “estudiosos”. Pedro e João também eram “… indoutos e comuns..” ( Atos 4:13 ). Acredito que toda essa “misturada” teológica/doutrinária, se deve justamente a esses estudiosos. Que fazem interpretações das mais diversas! E como você mesmo disse…..” adotando sua própria dedução como sendo a verdade “! Há mais divergência do que convergência! Um estudo introdutório da Bíblia é sem dúvidas VÁLIDO e bom! A questão é… “de qual linha teológica? Batista? Assembleiana? Universal? Católica? Adventísta? testemunhas de Jeová? Verbo da vida? Igreja de Deus unida?…… etc,etc,etc! TODOS afirmam, e conseguem “provar” nas escrituras, que estão com A VERDADE! Acaso existe mais de uma? ( VERDADE )
Valdir, obrigado por escrever este comentário aqui. De fato, todas as denominações são fruto de diferenças doutrinárias e teológicas. O meio correto de se entender as Escrituras é por seu texto e contexto original hebraico. Fazendo isso evitasse muitos erros.