Jesus e as porções semanais da Torá

O texto de Lucas 4:16 diz muita coisa, e não só a respeito de um costume praticado pelo próprio Senhor Jesus, que a muito tempo se perdeu nas igrejas cristãs; mas fala ainda de todo um contexto histórico por trás da cena, contexto do qual toda cristandade, infelizmente, está distanciada e até desapercebida, isto é, a vida judaica/israelita de Jesus, recebida das Escrituras e pelas boas tradições de seu povo. Como pode um povo que alega ser o povo do Cristo, não praticar costumes, hábitos e mandamentos que ele mesmo praticava? Neste estudo bíblico porém, vamos abordar com mais foco o costume que Jesus tinha de ler e estudar as porções semanais da Torá.

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O que Lucas 4:16 diz sobre Jesus e as porções semanais da Torá?

Vou recitar este versículo numa tradução bíblica cristã comum para ver que, mesmo nelas, é possível perceber que Jesus, na verdade, viveu bem diferentemente do modo que é a vida evangélica/cristã que se desenvolveu ao longo da história e é vivida até hoje em dia.

E, chegando a Nazaré, onde fora criado, entrou num dia de sábado, segundo o seu costume, na sinagoga, e levantou-se para ler.

(Lucas 4:16 Almeida Corrigida Fiel – ACF)

Primeiro de tudo, o texto diz que ele foi criado na cidade chamada Nazaré, como lemos também em Mt 2:23, Lc 2:39 e Jo 1:45; nada de mais até aqui. Mas o texto continua ao dizer que ele entrou numa sinagoga judaica num dia de sábado (shabat).

Daqui por diante podemos começar a notar algumas coisas estranhas para o cristianismo de hoje em dia. Será que um cristão, acostumado aos cultos de domingo a noite e às escolas bíblicas dominicais, acharia normal entrar numa sinagoga judaica no sábado pela manhã e participar de seu serviço matinal de leitura e estudo da Torá, isto é, da Lei de Moisés?

Independente da resposta, o texto de Lucas 4:16 diz que Jesus não só entrou na sinagoga no dia do shabat para ler as Escrituras, mas como também afirma que isto era um costume dele.

Ou seja, durante toda sua vida (infância, adolescência e juventude), ele esteve ali naquela sinagoga de judeus (bem como em outras, provavelmente), aprendendo as Escrituras. E não somente isso, mas para acrescentar conhecimento ao nosso estudo, ele também participou das festas judaicas (bíblicas) a sua vida inteira, junto de seus pais, irmãos e discípulos, basta ver Lc 2:41-42, 22:7-8, Jo 5:1, 11:55-56, 12:12-13, 7:2-10, 10:22-23, etc. Festas estas que não são sequer lembradas durante o ano em quase totalidade das comunidades cristãs.

Neste ponto devemos nos questionar: Já que o Messias participava dessas festas (bem como de muitos outros eventos e costumes bíblico-judaicos), porque não, e justamente, todos aqueles que se dizem seus discípulos? Aliás, por falar em discípulos, aqueles que foram discípulos diretos dele, também estavam envolvidos nessa vida judaica/israelita, vide At 2:1,46, 10:10-14, 18:18,21, 20:6,16, 21:24, 24:11, 1Co 16:8, etc.

Mas, retomando ao assunto de nosso estudo, Jesus e as porções semanais da Torá, vejamos como este costume começou e foi mantido ao longo da história.

É, praticamente, com os eventos de Neemias 8, nos anos finais do século 6 AEC, que o costume de se ler porções (trechos específicos) da Torá toda semana se inicia. Naquela ocasião, Esdras (Ezra), o sacerdote e escriba que liderava uma equipe de instrutores da Lei de Deus, fez uma leitura pública da mesma a todo o povo que estava retornando do cativeiro na Babilônia. Em Neemias 8:1-6a, na mesma tradução bíblica citada anteriormente, lemos:

E chegado o sétimo mês, e estando os filhos de Israel nas suas cidades, todo o povo se ajuntou como um só homem, na praça, diante da porta das águas; e disseram a Esdras, o escriba, que trouxesse o livro da lei de Moisés, que o SENHOR tinha ordenado a Israel.
E Esdras, o sacerdote, trouxe a lei perante a congregação, tanto de homens como de mulheres, e todos os que podiam ouvir com entendimento, no primeiro dia do sétimo mês.
E leu no livro diante da praça, que está diante da porta das águas, desde a alva até ao meio-dia, perante homens e mulheres, e os que podiam entender; e os ouvidos de todo o povo estavam atentos ao livro da lei.
E Esdras, o escriba, estava sobre um púlpito de madeira, que fizeram para aquele fim;

A partir daí, passando pelo tempo de Jesus (Yeshua) e seus discípulos, porções da Torá são lidas semanalmente nas reuniões judaicas que acontecem todo sábado pela manhã. As mesmas leituras são realizadas no mundo todo. Um púlpito de madeira elevado é utilizado pelos leitores, pois o trecho é dividido em sete partes onde cada um lê um pouco (por isso que Lc 4:16 diz que Jesus “levantou-se para ler”). A Bíblia Judaica Completa, trabalho do David Stern, bem como outras obras produzidas pelo povo de Israel, possui a divisão dos trechos para leitura e onde cada porção começa e termina.

Textos como Atos 13:14-15 e 17:1-2, mostram o envolvimento rotineiro dos discípulos do Senhor Jesus nos serviços de leitura das porções semanais da Torá, nas sinagogas judaicas.

Em Lc 4:16 ele lê o texto de Isaías porque existem também porções semanais dos profetas, que são lidas paralelamente às da Torá; estas são chamadas Haftará ou Haftarot no plural [hebraico].

Então, temos Jesus envolvido com seu povo, Israel, não só na leitura das porções semanais da Torá, mas em toda sua cultura e costumes, bem como seus discípulos também. Logo, o que nos impede de verdadeiramente nos apresentarmos como discípulos dele hoje em dia? Já que ele disse, “basta ao discípulo ser como seu mestre” (Mt 10:24-25).

No entanto, recomendamos assumir tal identidade sob orientação de comunidades judaicas que preservaram os costumes dele, como a Comunidade Judaica Netzarim do Pará, com a qual estamos estudando.

Nos canais do Blog Bíblia se Ensina, estamos enviando diariamente sugestões de leitura das porções semanais da Torá. Participe pelo WhatsApp no endereço http://bit.ly/wabse, ou pelo Telegram (recomendado) em https://t.me/bibliaseensina. Além disso, temos publicado o resumo de cada uma delas em nosso site https://biblia.pro.br/tag/parasha.

Para mais conhecimento das porções semanais da Torá, bem como da própria Torá (Lei de Deus), recomendamos a obra Torá: a lei de Moisés, por Meir Matzliah Melamed 👇